Saturday, August 16, 2008

Ser editor, hoje, Começa a 20a. Bienal do Livro

Dia 14 de agosto começou a Bienal do Livro. A Musa não está lá. Gostaria de estar, como muitas vezes esteve. Mesmo preferindo o modelo alternativo já consagrado das Primaveras dos Livros, no Rio e em São Paulo. Existe o custo dos estandes, preço hoje impossível para pequenas editoras independentes. Marcar presença lá é indispensável, apesar do gigantismo e do privilégio dado ao grande saldão de títulos para o público médio do brasileiro médio. Há pessoas que iam, não vão mais à Bienal. Inclusive jovens estudantes intelectualizados da metrópole. Não é lugar para lançar livro ou atrair convidados para autores, atores e cantores que não sejam célebres, como muitos se iludem. A realidade é outra. Mas o evento mobiliza o país e traz gente de fora. Tornou-se indispensável. Irei, sim, à Bienal. Ela irá de novo se refinar, como se refinará o grande público que começa a freqüentá-la e tomará gosto pelo relacionar-se com um livro e decidir comprá-lo, levando-o para casa como companhia entre geladeiras e aparelhos eletrônicos. Um livro faz boa companhia até para um celular, este vício geral, de ricos, médios, sobretudo dos pobres. Todos somos pobres, culturalmente néscios. O bom livro salva.

A cobertura da mídia, sobretudo das TVs resvala para as curiosidades. Os assuntos sérios do livro não são levados a sério pela mídia festiva. O Antonio Gonçalves Filho fala justo do feirão de ofertas, algum outro diz que não é só comércio, há Cafés literários e outras discussões paralelas e atrações bonitas. Lugar de rever a Ana Maria Santeiro, a agente literária mais simpática do Brasil, pioneira de muitas coisas, a feliz e fiel agente do fenômeno dos livros infantis, a simpaticíssima Ruth Rocha, e de muitos outros autores. É minha amiga a querida Ana Maria Santeira. Se não pude encontrá-la na Bienal, vejo-a na Primavera.

Leio matérias sobre a abertura, as presenças de políticos e candidatos, governador José Serra (mandou o povo ler x livros, infinitamente, não há melhor caminho para a formação pessoal, mas que sejam bons livros), prefeito Kassab (estamos esperando a compra para as Salas de Leitura prometida para o início do ano, atendemos à gincana de envio de exemplares para exame e até agora, esperamos, esperamos), secretário de Estado da Cultura João Sayad, ministro interino da Cultura Juca Ferreira, candidata Marta Suplicy (uma compradora de livros na sua gestão como prefeita, como o foi Marilena Chauí, na Secretaria da Cultura, sem nenhuma enrolação, ou espera infinita para os editores aflitos, pagando tudo no curto prazo e concretizando negócios no longo prazo, um desequilíbrio, como haverá sustentabilidade?).

Quero destacar uma frase do ministro interino da Cultura Juca Ferreira (sou simpática às suas teses, leio seus artigos e entrevistas), ele pediu aos editores que baixem os preços dos livros. Somente os editores? Precisa conversar conosco para ter idéia. Primeiro, aquela isenção do Cofins não atinge os que optaram pelo Simples. Isto nem é nada diante do horror maior, e a nossa impotência diante da rapina pela fúria arrecadatória das tarifas: enviar livro pelos Correios, mesmo pelo PAC, custa quase o preço de capa. Não subimos os preços dos livros, mas os Correios sobem suas tarifas a qualquer pretexto, em qualquer tempo. As tarifas telefônicas são extraordinárias. A regulação das tarifas bancárias elevou às alturas o que era altíssimo, somos literalmente "furtados" em nossas contas correntes. O Banco do Brasil pratica uma fúria arrecadatória sem par, com as mais audazes armadilhas, que fica impossível ao cliente controlar sua conta. Sabotam todos os direitos à informação prévia do que vai ser descontado da sua conta corrente. É um banco "Todo Seu", a mais pura mentira, embora eu goste de ter conta lá (seu Gerenciador Financeiro é o mais perfeito site bancário), mas o BB precisa ensinar direito constitucional aos que estão na ponta do atendimento, sobretudo aos acólitos que atuam na pessoa física. As gráficas, depois de verem os montantes das vendas para o governo, desconhecendo os diversos custos que compõem o total, resolveram aumentar seus preços, há casos em que os custos gráficos incluindo o papel ultrapassam o 50% do líquido a receber. Nós, editores, arcamos com todos os custos e descontos, ministro Juca Ferreira. Pagam-nos cada vez menos e ainda nos pedem para doar livros todos os dias (que os cidadãos comuns e ricos mecenas doem livros comprados às livrarias e editoras), como se não houvesse a cadeia produtiva do livro, como se não existisse a Economia do livro. Temos de virar uma santa Maria Egipcíaca do poema de Manuel Bandeira que, ao não ter mais nada com que pagar a passagem, extorquida pelo barqueiro, entregou sua nudez. Assim estamos nós, editores independentes, esperando, esperando, esperando. Quase todos nus. Num cotidiano de extorsões, via de mão única. Impotentes. Ou aderimos ou não podemos provar a rala sopa. Como baixar o preço dos livros sem incluir todos os custos, assim mesmo a taxa de comercialização vai até 65% para os distribuidores? Não temos incentivo. Todos nos desprezam na prática. Ainda há o custo da burocracia. Aí está "a banalidade do mal", no ninho burocrático onde são chocados ovos de pequenas serpentes. Enquanto nossos ovos de livros soltarão pássaros.

Livrarias tradicionais fecharam, ninguém fez nada. Há acervos apodrecendo nos depósitos. Sugiro que haja uma troca de impostos atrasados por livros para as Bibliotecas públicas. Não estão sugerindo esse tipo de compensação para outras áreas? Salvem os editores e as livrarias. Nem falei dos juros.

Está na hora de reler, não canso de repetir, o canto 45, poema de Ezra Pound, "Com usura", acrescento com tarifas extorsivas e esperas infinitas

Nenhum homem tem casa de boa pedra/ ia citar aleatoriamente o poema, mas o procurem neste meu blog Ana Candocha Opinião Própria ou no breviario.org/ludambula. Ou no própria antologia de Ezra Pound, traduzida por Augusto e Haroldo de Campos et all.

A Bienal está aí também para discutirmos a realidade do livro, das editoras e livrarias, muito mais, de toda a cadeia do livro. Ela não é apenas um monte de eventos curiosos, com um Pequeno Príncipe gigante. O próprio Pequeno Príncipe nos convida a adivinhar o que está atrás de um desenho de um chapéu, que na verdade não é um chapéu. A Bienal do livro parece ser o desenho de um chapéu, mas, por favor, vejam além, vejam a realidade do mercado editorial, um carneiro que hoje está tosquiado, apesar de os ufanismos de sempre. Estamos ainda na era do pré-consumo do livro. COMPRAR LIVROS, O CONSUMO NECESSÁRIO. Vamos para a Bienal. vamos para as livrarias.

1 Comments:

Blogger Ana Maria Santeiro said...

Oi, Ana Cândida,

Achei por acaso o seu blog. E esse artigo tão simpático e bem pensado e escrito, com ótimas idéias.

beijão,
ana santeiro

2:08 PM  

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