Monday, February 15, 2010

"I'm Nobody! " "Não sou Ninguém" a busca de um livro

I'm Nobody! Who are you?
Are you -- Nobody -- Too?
Then there's a pair of us?
Don't tell! they'd advertise -- You know!

How dreary -- to be -- Somebody!
How public -- like a Frog --
To tell one's name -- the livelong June --
To an admiring Bog!


(Emiily Dickinson, 1861)

Este poema de Emily Dickinson é minha paixão e Paixão. Estes versos emblemáticos "não sou ninguém/ e você, ninguém, também / então somos um par /não conte, podem espalhar" configuram minha alma profissional e pessoal. Definem a reciprocidade, esta cláusula pétrea que deveria ser respeitada em todos os contratos. O que foge a qualquer simples adesão. Prefiro a cumplicidade no meu ofício à competição. Eu busco equipe afinada, busco pares, não existe coisa quase impossível, mais trabalhosa. Às vezes existe apenas um par. Ou estamos sós com o desejo de um par. Falo de equipes de trabalho, nem toco em corporativismo. Hoje até a poesia se degenerou em corporativismos. Não há novos movimentos poéticos, mas grupos corporativistas que fazem recitais, atuantes em círculos restritos aos seus interesses imediatos. Compromisso com a poesia, nenhum. Apenas eventos que se somam às estatísticas "culturais" ou mesmo pseudoculturais. Prefiro os nomes sozinhos. Os prêmios para edição oferecidos pelas Secretarias de Cultura são cobiçados juntamente com os prêmios dos colegas. Uma festa pela autoedição, nesses casos, proliferam cooptações oportunistas. As Secretarias de Cultura deveriam tomar cuidado com essas distorções na ponta, a apropriação do público pela ambição pessoal privada.Paro por aqui, pois quero escrever sobre isto num post depois: "A Poesia hoje é corporativismo?" Onde está Mário de Andrade para aparar nossos meros lirismos quando ainda não chegamos à Poesia? Eu conheço Ivo Barroso e Ivan Junqueira, vozes discretas grandes vozes que se correspondem com alguns dos "novos poetas" (já editei Eric Ponty, um deles avaliado por eles, esta descoberta que preciso ainda cultivar na editora, apesar do temperamento, mas a voz poética é única). Onde haverá um movimento? Mas sempre sobram os poetas sozinhos. Pessoa, Baudelaire, Maiakóvski, Drummond, Cabral, este Augusto de Campos que é Augusto de Campos, poeta e tradutor de poesia, há mais nomes.

Eu soube com alegria que Augusto de Campos, pertecente ao movimento da Poesia Concreta, dera o título "Não sou ninguém" para os poemas escolhidos da obra de Emily Dickinson, que reuniu e traduziu com o esmero de seu trabalho. Fiquei "doida" para encontrar o livro. Só pensava nisso. Pessoalmente gratificada. Ratificada em minha convicção. "Não sou ninguém".

Acabei indo ao Cole, feira organizada pela Associação Brasileira de Leitura, na Unicamp, e comprei diretamente o livro no estande da Editora da Unicamp, que o editou. Guardei o livro como um troféu. Sentada no estande da Musa, lia e relia os poemas de Emily Dickinson traduzidos por Augusto de Campos, pronta a dividr tão boa notícia com os leitores do meu blog.E demorei, falando de outras coisas, prementes devido às circunstâncias. Mais premente é a eternidade deste livro, que vale por mil livros e por todos os não-livros expostos como areia pelas prateleiras gerais. Sacudir a bateia e achar esta joia. Um diamante livro.

A despojada edição é um luxo primoroso, a capa, criação de Augusto de Campos, um poema concreto, dos melhores. O livro está comigo, viaja comigo,permanece à cabeceira com os poemas de São João da Cruz traduzidos e apresentados por Marco Lucchesi, em edição bilíngue da Lacerda,como "Pequena antologia amorosa", e também o "Libro de la vida", de Santa Teresa de Ávila, publicação da Cátedra, espanhola, ainda não traduzido. Além das "Obras Completas", de Teresa de Lisieux, presente de Frei Patrício Schiadini, frade carmelita da igreja de Santa Teresinha de Higienópolis. E sempre outros clássicos, que deixo de enumerar. Para mim, a melhor história de amor da literatura universal intitula-se "O morro dos ventos uivantes". E a grande lição de autoestima autêntica é o verso de Emily Dickinson: "Não sou Ninguém!"

Que Augusto de Campos possa me permitir a citação de sua tradução, especialmente (há muitas), para o deleite do leitor, quem sabe um par, pois um livro busca entre os seus leitores seu par (o princípio da reciprocidade que norteia e gera o que é vida sempre):

"Não sou Ninguém! Quem é você?
Ninguém -- Também?
Então somos um par?
Não conte! Podem espalhar!

Que triste -- ser -- Alguém!
Que pública -- a Fama --
Dizer seu nome -- como a Rã --
Para as palmas da Lama!"

(Trad. de Augusto de Campos,Campinas, Editora da Unicamp, 2009, p.41)

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