Sunday, June 15, 2008

Ser editor, hoje, nos ecos de 1968, heranças da ditadura em torturas econômicas

Parece um título temerário, herdamos a conquista da revolução de costumes e vitórias em aberturas políticas. Mas os torturadores saíram dos porões e se revitalizaram nos maus costumes econômicos. No orgasmo burocrático. Na cegueira dos bancários, a serviço dos banqueiros, sobretudo na mecanicidade dos funcionários e executivos dos bancos oficiais. A "inteligência" mecânica é arrasadora. Ela inventa obstáculos desnecessários, surpreende com resoluções sem prévio aviso que sabotam o bom andamento cotidiano dos negócios. Brincam de criar pequenas armadilhas com uma inconseqüência criminosa no dia-a-dia. Inventam que não podem mais descontar duplicatas de uma ótima livraria com risco zero e 100% adimplente, pois se ela compra bastante e nos paga e ao banco, é detectada a concentração de títulos. Sem aviso, dizem, seus títulos não servem mais. E você fica sabendo no outro dia, interrompendo-se um círculo virtuoso e vital para a sobrevivência de qualquer empresa, sem aviso, sem nenhuma reflexão negocial, crianças inconseqüentes. Os banqueiros, sobretudo a rede oficial, não entenderam que hoje existem redes de livrarias, cada loja uma livraria autônoma, nem todas uma rede de franquias, com os riscos inerentes. Todos se pautam pela desinformação, pela descontextualização criminosa. Não se pode matar o trabalho honesto indiscriminadamente, colocando-se os empresários em paus-de-arara paralisantes de seus movimentos. Quebram a alma dos empreendedores por dentro, e assim em todos os âmbitos em que a macroeconomia da ditadura neoliberal esmaga indiscriminadamente. É hora de o capitalismo perder o seu adjetivo de selvagem e ganhar inteligência negocial para que todos possam humanamente prosperar. Estou usando jargões, sim, mas espero que o meu trabalho não se transforme em um porão da tortura econômica, aliás, isto nós já vemos de forma generalizada. O país como imenso Portugal dos navegadores descobridores, não, mas como um imenso porão da tortura econômica.

Se formos descrever a sanha cotidiana desses burocratas torturadores econômicos, temos que chegar ao silêncio de Jesus diante de Pilatos. "Nada mais respondeu". Tudo demora a nosso favor. Tudo é rápido a favor deles. A inteligência negocial é zero. Não existe. Entre os ecos de 1968, a persistência de torturadores em todas as formas de tortura na rede econômica e judicial, ainda há uma revolução econômica a ser feita. A democracia econômica para o bem de todos os cidadãos, não a serviço da ganância de poucos e seus métodos truculentos, que a cada ação, mesmo jurídica, é mostrado ao cidadão que ele não tem direitos, tem de se submeter a quem exerce direitos mediante leis iníquas, ou acima de quaisquer leis. Ou de medidas provisórias, preciso de achar o número de uma delas, que vem dar mais aval aos que confiscam a alma dos empreendedores em todas as áreas, uma festa para usurários de plantão (a propósito, está na hora de espalhar o poema de Ezra Pound, "Com usura, nenhum homem tem casa de boa pedra..." etc. está num dos posts deste blog). Reitero: o livro no Brasil ainda está na era do pré-consumo e o país necessita deste instrumento perfeito que é o bom livro para desenvolver-se. Ser editor, hoje, é uma teimosia. Em busca de bons estímulos. Não vamos nos entregar a torturas, mas denunciá-las. Sei que lêem este blog, deixem comentários, quero ouvir outras vozes.

Aí está o grande obstáculo ao desenvolvimento do país em uma mais aparente do que real democracia.

Mesmo assim, nesse maio em que se relembra o ano que não acabou ou temos de lhe ampliar os rumos?, 1968, a Musa lançou dois livros, com anos de gestação, à espera em sua programação de casa com poucos recursos e sofrendo as agruras da tortura econômica cotidiana, "Devoradores", de Astolfo Araújo, o cineasta de "O Ibrahim do Subúrbio" e criador com Wladyr Nader e Hamilton Trevisan, nos anos 70, quando morreu Wladimir Herzog, da revista literária "Escrita" que revelou muitos dos escritores consagrados que hoje freqüentam a mídia na literatura brasileira (algum desses deveria assinar uma resenha, como Fávio Moreira da Costa, também presença nas páginas reveladoras da memorável "Escrita", escreveu esplêndida orelha); um livro para iniciados, "Devoradores". O outro livro é "A Cultura da Juventude: de 1950 a 1970", de Waldenyr Caldas, professor da ECA-Usp, sociólogo e estudioso da cultura de massas. Ele fala de uma juventude transclassista. O livro foi lançado. no dia 10 de junho, no Memorial da América Latina, durante o seminário "Ecos de 1968: repercussões na América Latina, promovido pelo Memorial. Sugiro ler o hotsite do livro, basta acessar o Google e escrever A "Cultura da Juventude", de Waldenyr Caldas, lá está o prefácio de Massimo Canevaci (?), da Universidade de Roma. No site http://www.livrariacultura.com.br/ pode-se degustar o primeiro capitulo desses dois livros com ecos de 1968, em duas frentes diversas, "Devoradores" e "A Cultura da Juventude". E vai lançar um livro de um bancário, contra bancos, cujo texto final está sendo gestado, o livro do mineiro Clóvison, "Demiti o banco da minha vida". É um exagero, precisamos de bons serviços bancários, a serviço da inteligência, não apenas da ganância, armadilhas nada sutis sob os pés do país que quer se desenvolver como nação de todos, mas vamos usar a caricatura para denunciar a cara.

Nosso maior trabalho é impedir que burocratas e acólitos cegos fechem nossas editoras com todo tipo de armadilhas. Para isso temos de criar asas todos os dias e voar acima deste chão minado. Democracia econômica já e detenção aos "torturadores" que impedem a vida das empresas e o desenvolvimento do país. Isto não é nenhum apelo ao laissez-faire, que já campeia nas negociatas, nós apenas queremos trazer humanidade ao mundo do trabalho e que os projetos se realizem para a alegria de todos. Novas utopias: o direito ao trabalho sem submissões inúteis.

Sunday, June 01, 2008

Ser editor, hoje

Ser editor, hoje. Ser editor independente, hoje. Ser pequeno editor independente, hoje.

Não podemos abrir a porta para qualquer um. Mesmo para aqueles que chegam com flores nos braços e promessas nos lábios. Só podemos abrir a porta para aquele que prove aquilo que se diz no poema de Emily Dickinson (não vou citar literalmente, agora, os versos,mas direi o sentido): "Quem sou eu? --- Ninguém. Quem é você? -- Ninguém. -- Então, somos um par."

Só podemos acolher aqueles com quem nos tornamos um par, porque um editor vive de acordos mútuos, na alegria e nas provações. Com a reciprocidade sadia sempre podemos estabelecer acordos, um poderá enxergar o lado do outro e acolhê-lo, mesmo que tenhamos de arrancar espinhos. Mas todos erramos em nossas avaliações e nada é linear.

Ser editor não é prestação de serviço, é projetar algo, é comungar projetos e ter o tempo para programá-los, apesar das intempéries do mercado editorial, pois vivemos ainda em uma sociedade do pré-consumo do livro. As compras governamentais são interessantes; estão, no plano federal e no Estado de São Paulo, mais abertas à diversidade e a isonomia já existe. Mas há grande caminho a percorrer, ainda tudo funciona como uma gincana cruel, na hora curta da inscrição, sobremaneira. Porque o tempo é insuficiente. Vi livrarias tradicionais fechando, editoras minguando, se o governo fizesse com essas casas e seus acervos compras de livros para pagar seus débitos tributários, como está fazendo em outras áreas, elas teriam se salvado. O centro da cidade de São Paulo despojou-se das melhores casas. O que se vê não é o estímulo ao hábito de comprar livros, mas ao de doar livros. Como poderão editores e livreiros pagarem seus fornecedores e tributos, se uma Biblioteca Nacional de Brasília, que custou milhões, com suas estantes vazias, espera também por doações das editoras? Comprar livros, um hábito necessário. Eu dizia, o consumo necessário, mas é óbvio que o hábito saudável leva ao consumo necessário dos livros.

Ser editor é aprender a não transigir. Ser editor cultural ou de criação, não apenas publicador atendente de demandas fáceis e fúteis, é sobretudo criar demandas até o inesperado.

Ser editor é fechar as portas aos oportunistas e caprichosos. Não se faz o que o outro quer, mas o que desejamos, juntos, fazer. Ser editor não é estar atrás do balcão, embora gostemos de colocar nossos umbigos diante de uma mesa cheia de livros. "Livros na mesa", como uma boa ceia.

Ser editor é nos darmos ao respeito, como gostamos de respeitar. É conquistar a liberdade. Em vez de nos escravizar. Por isso, mais do que nunca, ser editor é termos a prudência de trancar portas, abri-las somente para um par, de par em par. Mas como reconhecer um par?

(Continua) Aceito sugestões.