Saturday, May 30, 2009

Modismo das Escolhas "Ler e Escrever"

Avançou-se muito nas compras governamentais. Programas foram criados e aprimorados, no sentido de abranger a universalidade, a não repetição de acervos, o teto para inscrição de títulos (para que os maiores não atropelem os menores, mas criam-se novos selos para driblar este limite). Mesmo assim, a inquidade concentratória foi derrotada nos principais programas do MEC, sobretudo no Programa Nacional Biblioteca da Escola do FNDE. Ainda não basta. Porque o MEC precisa positivamente contagiar as pontas da educação e cultura, secretarias de estado e secretarias municipais.

Prefeitos, sobretudo do interior, embarcam em pacotes prontos a preços astronômicos, que privilegiam apostilas que subtraem com licença ou sem licença conteúdo dos livros editados e mastigam para os incautos em linguagem com erros crassos ou diluições ralas da polpa nutricional a que todos têm direito. Roubam o acesso ao livro. Não há desculpas para prosperarem as abomináveis apostilas, devemos radicalizar nossas vozes contra. Houve recentemente uma chamada para Pregão Eletrônico, da Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro, que destinava quatro milhões de reais para compra de apenas dez títulos e ninguém foi informado. Ficamos sabendo que era um desse pacotes fechados com grande instituição. Parece que a coisa foi consertada, após protestos de alguns editores bem atentos, o pregão foi suspenso, tomara que todos sejamos chamados para apresentação de nossos catálogos, com um teto para inscrição de títulos por editora, é claro. Tratava-se de um pacote criado pela Fundação Roberto Marinho, que negocia também pacotes com prefeituras e secretarias de estado. Se baixamos a guarda, a concentração vantajosa para pouquíssimos numa sabotagem ao princípio da isonomia e à bibliodiversidade, cobrirá o país e a economia do livro será massacrada por equívocos gerados pela desinformação de nossos órgãos públicos, municipais e estaduais, cujos ocupantes embarcam ao chamado do canto das sereias espertas e se esquecem de que há uma universalidade de editoras grandes e pequenas e grande diversidade de bons livros no mundo editorial destacando-se como pérolas na amplitude das edições descartáveis. A bibliodiversidade é possível na formação de acervos ricos, numerosos e variados. Cada livro é único, juntos e variados formam acervos que podem formar pessoas, atraí-las às bibliotecas escolares e comunitárias. Pacotes vendidos fechados trazem o equívoco, escravizam para o consumo de quinquilharias pseupedagógicas, pseudoliterárias e pseudoculturais. Além do pésimo hábito de se chover sempre no molhado, não vendo nada além do modismo médio das escolhas sobre sempre os mesmos, alguns bons autores, mas eles mesmos clamam para além disso. Bons autores clamam pela companhia de outros bons autores. Tocar o coração do público médio com bons autores e bons livros, pinçados da diversidade dos catálogos.

Mesmo em programas respeitáveis, há o equívoco das escolhas. Para a vivência média precisamos das classificações por faixa etária, nem aprovo censura, sobretudo não aprovo modismos. Livros bons são descartados, enquanto o modismo é valorizado. Chovem sempre no molhado, nem olham se poesia é mesmo poesia, "vamos escolher o tema, o gênero, a gracinha no lugar do humor, a historinha no lugar da narrativa, vamos renegar os mestres, vamos valorizar a fórmula em vez da forma". Eu disse que "O Elefante Infante", do Rudyard Kipling, não entrou em São Paulo, que eu julgo um estado respeitável, cujos programas foram sempre bem conduzidos em termos de inscrição e escolha (salvo esses modismos que levaram o "inadequado" às crianças da terceira série,"é" quadrinhos, vamos escolher, temos de colocar quadrinhos na Biblioteca" (o livro escolhido pode nem ser ruim, porque se destina a um estágio além de maturidade, o problema em qualquer estágio é o avaliar por tópicos pedagógicos de moda, não por valores literários), sejam quadrinhos ou o que quer que seja, ora, temos é de colocar bons livros, de autores óbvios ou não, até gente de fama escreve literariamente maus livros, temos de descobrir bons livros, além do óbvio, para formar acervos para as bibliotecas escolares e comunitárias). O "Elefante Infante", de Rudyard Kipling, tradução do Adriano Messias, ilustrações do Fernando Vilela, entrou na Prefeitura de Belo Horizonte. Quem viu enxergou, entrou também no programa "Mais Cultura" do Ministério da Cultura/Biblioteca Nacional. Mas deste belo programa preciso falar algo, falo em parágrafo abaixo.

Agora quero tocar nesse equívoco do modismo das escolhas por quem prefere chover no molhado e executar fórmulas, do que enxergar bons livros com aspecto não óbvio, tanto no projeto gráfico como no conteúdo. É muita receita pronta de bolinho e pouca ousadia. Quando falo de ousadia, peço para enxergar valores literários na simplicidade, não apenas o simplório da falsa poesia. As classificações de gênero, as cotas temáticas.

Há anos inscrevo "Ronda de Fogo", da Cacy Cordovil, em São Paulo e em todos os lugares. Este é livro para ensino médio, ou para Educação de Jovens e Adultos, EJA. Para quem não sabe, Cacy Cordovil foi a primeira musa do Vinícius de Moraes. Quando o livro saiu, Bernardo Ajzenberg escreveu na "Folha de S. Paulo": "O relançamento de "Ronda de Fogo", de Cacy Cordovil, é mais do que um resgate histórico oportuno e merecido. (...) Publicado originalmente em 1941, à véspera da autora completar 30 anos, pela prestigiosa Editora José Olympio [publicado hoje pela Musa Editora], obteve boa repercussão. Álvaro Lins, um dos maiores críticos que o país já teve, reconheceu nele 'um estilo singular' e admitiu ter tido à sua leitura uma 'impressão profunda'. Sérgio Milliet, outro nome de peso, viu na obra 'firmeza de construção', 'astúcia psicológica', 'indiscutível talento literário'. Monteiro Lobato notou-lhe a 'enfibradura dos que são escritores natos'. (...) Os contos de Cacy se dividem em dois grupos. Quatro são urbanos, os demais "causos" do interior do país. Neste segundo grupo surgem histórias de rendeiras, tropeiros, caçadores, coronéis, intrigas amorosas, batismos de fogo, confrontos com a natureza ou com entidades imateriais da mata. Não há estereótipos, porém. Os personagens são únicos, de vida própria, sofrem de modo autoral, por assim dizer." Mas Cacy, que veio a se tornar nora de Vicente de Carvalho interrompeu sua carreira literária, reaparecendo com o sempre novíssimo "Ronda de Fogo", nenhum avaliador oficial enxerga, não é óbvia, apesar do José Castello apresentá-la na orelha da edição da Musa e no texto da biografia do Vinícius, "Poeta da Paixão", como a primeira musa do autor do Soneto da Fidelidade. Mas nós que conhecemos a inesquecível Cacy, continuaremos a falar dela e a mostrar seu livro.

Prefeitura de São Paulo, tem um belo programa para Bibliotecas, associado aos órgãos de classe. mas padece do problema: ainda não impôs limite para as inscrições. Então a distorção está instalada. Há editora com 157 títulos escolhidos para as Salas de Leitura, pois cada editora diligente pode inscrever tudo o que tem em catálogo, sem limites, e, com marketing poderoso, impede a diversidade e ofende o princípio da isonomia, perpetrando a concentração daninha à economia do livro. Não há pois igualdade de oportunidades para os editores, mas favorecimento à gincana de quem chega primeiro e com mais títulos (mesmo em nossos catálogos, nem tudo é adequado à seleção ideal de um programa, conceder este privilégio do ilimitado nas inscrições é um prejuízo também para o público escolar e comunitário, alijado do além do mesmo em ofertas redundantes) . Como fez o MEC e faz cada dia mais, é preciso criar um código de ética da concorrência nessa corrida dos espertos. Mas este programa está atrasado, pois o prefeito Kassab não fez a dotação para que fosse cumprido no tempo prometido, os livros escolhidos para as 57 Salas de leitura, que seriam comprados até fevereiro deste ano. Estamos esperando, há notícias de retomada, mas é preciso ser o programa aperfeiçoado. Para contemplar a universalidade, a democratização das escolhas e a diversidade. Primeiro: teto para número de títulos por editora nas inscrições como faz exemplarmente o MEC, apesar das driblagens dos selos múltiplos das grandes casas.

Programa "Mais Cultura", do MinC, Biblioteca Nacional, temos de pedir ao ministro Juca Ferreira que interceda pelos editores nesse contingenciamento cruel de verbas federais, que nos fazem entregar os livros do programa em pequenas parcelas de 300, 300, 200, numa destinação de 2.500 exemplares. Por quê? Todos devem saber que temos de fazer a tiragem inteira para tornar viável o custo da edição. Neste caso, se fizermos os livros por demanda, inviabilizamos os custos. Estamos com os livros nos armazéns da gráfica, aguardando ordens para novas entregas. Isto vai longe. Sem nenhuma piedade pelos editores que resistem (Eu faço livros com quem morre, parodiando Manuel Bandeira, que comecei a ler na infância). Deveria ser como os programas do MEC, entregamos todos os livros juntos e só o Ministério da Cultura precisa ser vítima desse contingenciamento de verbas federais? Senhor Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, olhai para os pequenos editores da economia do livro, descontingenciando as verbas do principal programa do livro do Ministério da Cultura, o "MAIS CULTURA", que levará bibliotecas a todos os municípios brasileiros, levará mais, modernização de acervos. Eu fico muito honrada de "O Elefante Infante" e "O Sapo Apaixonado" , além de "Mata Atlântica: vinte razões para amá-la" terem sido livros incluídos nesse estupendo programa de modernização. A maior parte dos livros impressos encontram-se retidos nos armazéns da gráfica, à espera, e nós temos novos livros especiais para fazer. Contamos com esse dinheiro. Para a vida das pequenas editoras.

Wednesday, May 20, 2009

Feira de Livros no Colégio São Domingos

Sábado, 16 de maio. Feira de Livros no Colégio São Domingos, da Rua Monte Alegre, das Perdizes. Mesas pelo pátio da escola com os livros expostos. A simpatia das pessoas do colégio e do organizador Ronaldo, da Editora Alameda. Ele nos convidou e lá fomos para uma verdadeira feira de livros, que não era uma quermesse, mas uma verdadeira feira de livros, em que o livro era o protagonista. Alunos, pais de alunos, professores, bibliotecários, contadores de histórias, todos se aproximavam dos livros, folheavam, acolhiam, compravam. A Musa fez sua estreia lá no colégio em clima de convivência prazerosa. Mais feliz ficou com a acolhida do público para "O Elefante Infante", do Rudyard Kipling e para todos os seus livros infantis especiais, que são poucos, mas privilegiam o conteúdo e a edição. Obrigada, Colégio São Domingos pela acolhida às Editoras da Libre entre as outras editoras. No bairro há outros colégios que precisam se abrir para as pequenas editoras da Libre, que gostam de fazer a diferença.

Ser editor, hoje. Ir ao encontro do leitor de todas as idades. Um menino insistia com o pai, sendo chamado para ir embora: "Pai, quero um livro!" Como se pedisse uma guloseima, um tênis, um jogo. O livro no reino da necessidade de um menino. Isto é tudo.

Sunday, May 10, 2009

Poços de Caldas Caxambu Livros

Ser editor, hoje, ganhar o mundo. Por isso precisamos ter um tempo para cada livro. Mostrá-lo em todos os lugares.

Aonde fui nesta longa ponte dos feriados de Tiradentes e primeiro de maio? Peguei um táxi para Caxambu, carregando caixas de livros. Desembarquei no Hotel Glória. Ali meu irmão, o professor Sergio Roberto Costa, promovia com sua equipe o V SINAL: Simpósio Internacional de Letras Fronteiras do Contemporâneo -- Linguagem/Espaço/Máquina. Foi o primeiro lugar em que apresentei o Artemídia e Cultura Digital, com ótima acolhida, entre os presentes nacionais e os convidados internacionais. Lá se mostraram também os livros infantis especiais, O Sapo Apaixonado, do Donizete Galvão, com ilustrações de Mariana Massarani e O Elefante Infante, de Rudyard Kipling, tradução de Adriano Messias e ilustrações do Fernando Vilela. Que também tiveram acolhida e saída. Não se deve levar a um evento apenas os títulos focados diretamente nos assuntos do evento, os livros instrumentais. É preciso levar a diversidade e o que é especial nessa diversidade. Por isso arranjamos público ao meio do mar de lançamentos, livros como tempestade de areia a cobrir as praças e nossos olhos.

Na manhã de sábado, 25 de abril, eu entro numa sessão plenária, a própria mesa de encerramento, Multiletramento e Espaço Cultural: a voz e a letra, com as professoras Roxane Rojo (Unicamp) e Inês Signorini (Unicamp) e uma expressão lançada na fala bateu em mim e eu esqueci todo o resto: "o analfabetismo na cultura ocidental". Enfim, a luz. Ainda quero saber mais, falar mais. Este o nosso grande problema generalizado. Todos os especialistas e pseudoespecialistas analfabetos na nossa própria cultura ocidental. Ninguém quer História, ninguém quer Letras, ninguém quer Arte, ninguém quer Matemática. Ninguém quer nada, apenas o falso misticismo e um pseudo-orientalismo de moda. Mesmo os que passaram a ignorar a cultura ocidental desde o berço, desde a escola, por desconhecê-la, não conseguiram se alfabetizar nas outras culturas que arranham pelas vias do modismo, nunca do aprofundamento respeitoso. Eu sou o fruto da cultura ocidental, da rica tradição judaico-cristã e não vou negar isso, nem a "máquina do barroco", assunto de Alcir Pécora em sua fala plenária, também neste V Sinal.

Sergio Roberto Costa, professor precocemente aposentado da Universidade Federal de Juiz de Fora, andou pela Hungria, logo após deixar sua universidade, lecionando durante dois anos na Universidade de Budapeste. Voltou, foi para o interior de Minas, a convite, implantar cursos de pós-graduação na UNINCOR (Três Corações). Tudo com o apoio da Capes, Fapemig, CNPq, logotipos que integram as peças do V Sinal, além de outros apoiadores locais, Como Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Caxambu e o Hotel Glória, em que a hospedagem coletiva foi encontro feliz de muitos. Para mim, foi um retorno, pois eu nasci e vivi a infância entre as águas virtuosas (não é dupla regência, e se for).

No sábado mesmo, à tarde, viajei para Poços de Caldas no táxi do Bento, cheio de livros. Para participar da Feira Nacional de Poços de Caldas, de 25 de abril a 3 de maio. Se Caxambu, um evento universitário valeu a pena também financeiramente, o mesmo não posso dizer da feira de Poços de Caldas. Professores universitários ausentes e público consumidor de bugigangas impressas, salvo exceções. Mas valeu a pena, pela simpatia dos organizadores, convidados, visitas das cidades vizinhas e escolas. Por emendar Caxambu com a feira de Poços, não me preparei com as promoções para os escolares. Nunca com bugigangas dos impressos berrantes sem conteúdo, isto jamais, melhor morrer de fome do que transigir. Foi uma festa e eu quero voltar. Falarei das atrações e da homenagem a Guimarães Rosa (era o patrono) em posto especial.

Poços de Caldas é a mais bela das estâncias hidrominerais da região. Encantei-me com a cidade. Meu Hotel estava integrado à Praça Getúlio Vargas, em que está situado o relógio floral e as charretes. Numa delas, no domingo, antes do início diário do evento, passeei pela cidade. Voltei para casa com o propósito de morar em Poços de Caldas. Levar parte da Editora para lá, uma filial e o Departamento Editorial, a matriz poderá ficar em um escritório da Acaiaca, onde se encontra a logística da Musa.

Eu preciso dessa cidade plana, cercada de montanhas (não tão belíssimas com as da Serra da Mantiqueira, em Itajubá), nela posso caminhar, ir e voltar entre jardins originários sem o massacre predatório da ignorância modernosa de certas administrações públicas. São os jardins fiéis às suas origens delicadas, jardins fiéis de Poços de Caldas à sensibilidade de seus criadores, não importa em que época, jardineiros sensíveis criaram os jardins de Poços de Caldas. Se eu me migrar para o interior, estou escolhendo Poços de Caldas, pois Poços de Caldas me parece a mais cosmopolita das cidades do interior de Minas. Está sobre a cratera de um vulcão, onde estamos todos. A diferença, lá o vulcão está extinto.