Saturday, August 30, 2008

Ser editor, hoje, A Bienal terminou Toma posse o novo Ministro da Cultura

A Bienal terminou, nem vi balanço nos jornais. Não foi muito paparicada pela imprensa nem pelo público. O público mudou. Quem ia não vai mais. Mas quem vai, descobre o livro. Mesmo que seja por meio dos saldões. Faltam matérias de peso que discutam o livro e o mercado editorial. Tem muita coisa para se dizer, além de todos os ufanismos e sensacionalismos rasos do meramente curioso. O mercado editorial vive um drama, sempre o curto prazo brigando com o longo prazo: nossa vida é feita de esperas. E chega o e-mail: "somos exportadores, etc. etc., e pedem livros aos editores, a única coisa que têm para vender e viver. Aperfeiçoei a frase:

COMPRAR LIVROS, O GOSTO NECESSÁRIO. Eu tinha dito, o consumo necessário, porque enquanto outros objetos de desejo encontram-se na fase do pós-consumo, o bom livro, aquele que não é papel pintado ou mera receita edificante enganosa, está na fase do pré-consumo. Que finda a Bienal, quando se anunciam as Primaveras do Livro, em São Paulo e depois no Rio, que o gosto pelo livro tome conta das mentes e corações, o gosto necessário pelo livro. E sejamos menos bobos, indo além do óbvio, como disse o Luiz Fernando Veríssimo na sua crônica desta semana no Estadão. è mais ou menos isso, fazer o óbvio é fácil, ir além do óbvio ou ver além do óbvio que é a questão. Que os jornalistas cubram as Primaveras direito, porque no mundo inteiro há um movimento das editoras independentes muito interessante, que foge aos jargões repetitivos. Há livros sendo lançados, dois títulos já foram traduzidos no Brasil. Um deles, traduzido do francês, chama-se "Proteger o livro". Proteger também as editoras, não as fazendo esperar tanto.

Toma posse Juca Ferreira, o novo ministro da Cultura. Fui ler a entrevista dele ao Jotabê Medeiros. Toca no ponto, para marcar a importância da Cultura: de nada adianta o crescimento econômico, o acesso dos mais pobres aos bens de consumo da classe média, se não se toma gosto também por uma boa formação educacional e cultura. Não basta ser emergente financeiramente, é preciso formar-se culturalmente, emergir também educacionalmente. Eu era uma pré-adolescente e li "O Colecionador", e a personagem mencionava "a nova gente" e seu gosto duvidoso, pelos objetos medonhos que decoravam o porão do seqüestro, mas podemos dizer que o dinheiro somente sem a ascensão educacional e cultural tem nos trazido uma gente predatória. Como esses novos legisladores, que prestam assessoria aos deputados, tornando a legislação econômica mais draconiana, protegendo a rapinagem geral, pensando que todos são maus pagadores. O que eles estão criando são armadilhas pseudolegais impedindo as pessoas de pagarem suas dívidas. E o consumidor como fica? Isto é desumanização generalizada que somente a boa formação educacional éticocultural poderá resgatar. Vi uma entrevista de uma família bem sucedida que abomina consultores. São mesmo abomináveis, quando descambam para desqualificar os demais, gerando monstros legais para a sociedade indefesa.

O Banco do Brasil faz 200 anos, tem o melhor site e um esplêndido gerenciador financeiro na internet. Mas não cuida do atendimento ao cliente. Cria armadilhas diárias para os clientes, suas normas burocráticas são letais, contribuem para a morte não para a vida das empresas. Seus gerentes são amestrados a cuidar do próprio prontuário não de soluções negociais inteligentes. Não contextualizam nada, puxam o tapete enquanto andamos, prevalecem as mais burras normas burocráticas (aí está "a banalidade do mal", um nazismo bancário), fazem em débitos em conta cujo histórico não é mencionado, mas apenas dizem, débito de cobrança lote tal, do que se trata?, não sabemos. Agora trabalham com pacotes empresariais, você não pode resolver um assunto isolado sem optar por todos. O funcionário erra feio, quem paga o pato é o cliente.Antes eu era muito solidária com motoristas de ônibus (essas feras soltas, hoje não sou mais) e bancários (eles fazem o sucesso dos banqueiros, são mais realistas que o rei, ou é uma nova fauna que está aí apenas para servir de acólito para a rapina instituída e a perversidade como norma para angariar mais e mais como um falso Maquiavel de algibeira em que os fins justificam os meios?). Há exceções, tenho alguns bons amigos nos bancos, mas a regra é feia. Ainda contam com esses assistentes de legisladores e os emergentes sem alma na farra burocrática para ferrar e mais ferrar. A Ouvidoria é uma farsa, bem disse a a Maria Inês Dolci. Mandam tudo de volta para a agência. O problema está em quem cria normas que viram armadilhas a ponta, criando problemas em vez de inteligentes soluções negociais. Tudo é uma desconsideração ao cliente. "Todo seu" é um slogan enganoso. Os gerentes não têm idéia do que seja as Editoras, a relevância cultural do que fazem, repetem mecanicamente os mesmos jargões ouvidos da burocracia instalada para o mal, nunca para o bem da nação brasileira. Eu me divirto, mas comento. Pena não poder contar os casos, a discrição me impede e os amigos, aí sim, me matarão. Antes de abrir Centros Culturais, deveriam entender efetivamente o funcionamento da área da cultura e suas empresas. Sobretudo do livro.

Faltou na matéria do Jotabê Medeiros com o novo Ministro da Cultura, Juca Ferreira, maior ênfase à economia do livro. A entrevista pecou nessa ausência, viu Jotabê, que fez boas matérias quando a Musa lançou livros de ponta e deram imensa repercussão. Jotabê Medeiros, venha falar da Primavera dos Livros e ouça todo mundo. Tenho um livro sobre as Editoras independentes para você, traduzido do francês, ali estão as discussões essenciais da edição à comercialização do livro. Não será mais preciso repetir os mesmos jargões que levaram à criação das primeiras Primaveras dos livros. Há um avanço considerável, alguns recuos, não somos perfeitos, algo novo tem de ser pautado para o livro no mundo, hoje.

Saturday, August 16, 2008

Ser editor, hoje, Começa a 20a. Bienal do Livro

Dia 14 de agosto começou a Bienal do Livro. A Musa não está lá. Gostaria de estar, como muitas vezes esteve. Mesmo preferindo o modelo alternativo já consagrado das Primaveras dos Livros, no Rio e em São Paulo. Existe o custo dos estandes, preço hoje impossível para pequenas editoras independentes. Marcar presença lá é indispensável, apesar do gigantismo e do privilégio dado ao grande saldão de títulos para o público médio do brasileiro médio. Há pessoas que iam, não vão mais à Bienal. Inclusive jovens estudantes intelectualizados da metrópole. Não é lugar para lançar livro ou atrair convidados para autores, atores e cantores que não sejam célebres, como muitos se iludem. A realidade é outra. Mas o evento mobiliza o país e traz gente de fora. Tornou-se indispensável. Irei, sim, à Bienal. Ela irá de novo se refinar, como se refinará o grande público que começa a freqüentá-la e tomará gosto pelo relacionar-se com um livro e decidir comprá-lo, levando-o para casa como companhia entre geladeiras e aparelhos eletrônicos. Um livro faz boa companhia até para um celular, este vício geral, de ricos, médios, sobretudo dos pobres. Todos somos pobres, culturalmente néscios. O bom livro salva.

A cobertura da mídia, sobretudo das TVs resvala para as curiosidades. Os assuntos sérios do livro não são levados a sério pela mídia festiva. O Antonio Gonçalves Filho fala justo do feirão de ofertas, algum outro diz que não é só comércio, há Cafés literários e outras discussões paralelas e atrações bonitas. Lugar de rever a Ana Maria Santeiro, a agente literária mais simpática do Brasil, pioneira de muitas coisas, a feliz e fiel agente do fenômeno dos livros infantis, a simpaticíssima Ruth Rocha, e de muitos outros autores. É minha amiga a querida Ana Maria Santeira. Se não pude encontrá-la na Bienal, vejo-a na Primavera.

Leio matérias sobre a abertura, as presenças de políticos e candidatos, governador José Serra (mandou o povo ler x livros, infinitamente, não há melhor caminho para a formação pessoal, mas que sejam bons livros), prefeito Kassab (estamos esperando a compra para as Salas de Leitura prometida para o início do ano, atendemos à gincana de envio de exemplares para exame e até agora, esperamos, esperamos), secretário de Estado da Cultura João Sayad, ministro interino da Cultura Juca Ferreira, candidata Marta Suplicy (uma compradora de livros na sua gestão como prefeita, como o foi Marilena Chauí, na Secretaria da Cultura, sem nenhuma enrolação, ou espera infinita para os editores aflitos, pagando tudo no curto prazo e concretizando negócios no longo prazo, um desequilíbrio, como haverá sustentabilidade?).

Quero destacar uma frase do ministro interino da Cultura Juca Ferreira (sou simpática às suas teses, leio seus artigos e entrevistas), ele pediu aos editores que baixem os preços dos livros. Somente os editores? Precisa conversar conosco para ter idéia. Primeiro, aquela isenção do Cofins não atinge os que optaram pelo Simples. Isto nem é nada diante do horror maior, e a nossa impotência diante da rapina pela fúria arrecadatória das tarifas: enviar livro pelos Correios, mesmo pelo PAC, custa quase o preço de capa. Não subimos os preços dos livros, mas os Correios sobem suas tarifas a qualquer pretexto, em qualquer tempo. As tarifas telefônicas são extraordinárias. A regulação das tarifas bancárias elevou às alturas o que era altíssimo, somos literalmente "furtados" em nossas contas correntes. O Banco do Brasil pratica uma fúria arrecadatória sem par, com as mais audazes armadilhas, que fica impossível ao cliente controlar sua conta. Sabotam todos os direitos à informação prévia do que vai ser descontado da sua conta corrente. É um banco "Todo Seu", a mais pura mentira, embora eu goste de ter conta lá (seu Gerenciador Financeiro é o mais perfeito site bancário), mas o BB precisa ensinar direito constitucional aos que estão na ponta do atendimento, sobretudo aos acólitos que atuam na pessoa física. As gráficas, depois de verem os montantes das vendas para o governo, desconhecendo os diversos custos que compõem o total, resolveram aumentar seus preços, há casos em que os custos gráficos incluindo o papel ultrapassam o 50% do líquido a receber. Nós, editores, arcamos com todos os custos e descontos, ministro Juca Ferreira. Pagam-nos cada vez menos e ainda nos pedem para doar livros todos os dias (que os cidadãos comuns e ricos mecenas doem livros comprados às livrarias e editoras), como se não houvesse a cadeia produtiva do livro, como se não existisse a Economia do livro. Temos de virar uma santa Maria Egipcíaca do poema de Manuel Bandeira que, ao não ter mais nada com que pagar a passagem, extorquida pelo barqueiro, entregou sua nudez. Assim estamos nós, editores independentes, esperando, esperando, esperando. Quase todos nus. Num cotidiano de extorsões, via de mão única. Impotentes. Ou aderimos ou não podemos provar a rala sopa. Como baixar o preço dos livros sem incluir todos os custos, assim mesmo a taxa de comercialização vai até 65% para os distribuidores? Não temos incentivo. Todos nos desprezam na prática. Ainda há o custo da burocracia. Aí está "a banalidade do mal", no ninho burocrático onde são chocados ovos de pequenas serpentes. Enquanto nossos ovos de livros soltarão pássaros.

Livrarias tradicionais fecharam, ninguém fez nada. Há acervos apodrecendo nos depósitos. Sugiro que haja uma troca de impostos atrasados por livros para as Bibliotecas públicas. Não estão sugerindo esse tipo de compensação para outras áreas? Salvem os editores e as livrarias. Nem falei dos juros.

Está na hora de reler, não canso de repetir, o canto 45, poema de Ezra Pound, "Com usura", acrescento com tarifas extorsivas e esperas infinitas

Nenhum homem tem casa de boa pedra/ ia citar aleatoriamente o poema, mas o procurem neste meu blog Ana Candocha Opinião Própria ou no breviario.org/ludambula. Ou no própria antologia de Ezra Pound, traduzida por Augusto e Haroldo de Campos et all.

A Bienal está aí também para discutirmos a realidade do livro, das editoras e livrarias, muito mais, de toda a cadeia do livro. Ela não é apenas um monte de eventos curiosos, com um Pequeno Príncipe gigante. O próprio Pequeno Príncipe nos convida a adivinhar o que está atrás de um desenho de um chapéu, que na verdade não é um chapéu. A Bienal do livro parece ser o desenho de um chapéu, mas, por favor, vejam além, vejam a realidade do mercado editorial, um carneiro que hoje está tosquiado, apesar de os ufanismos de sempre. Estamos ainda na era do pré-consumo do livro. COMPRAR LIVROS, O CONSUMO NECESSÁRIO. Vamos para a Bienal. vamos para as livrarias.

Sunday, August 10, 2008

Ser editor, hoje Solidariedade dos pares e o "jornal do jornal"

Estar de pé. Como um bravo limoeiro na terra. Um pomar de frutas cítricas. Não temos mais de ser agradáveis quando os burocratas bancários são incentivados a ludibriar clientes com suas armadilhas arrecadatórias e enfeitar seus prontuários.

Nós nos sustentamos com operações a longo prazo. É uma evidência sem contestação. Operações a longo prazo não dizem respeito a parcelamentos mensais de longa duração, em que as prestações são sufocantes, pois contêm a perversa capitalização dos juros. O longo prazo tem a ver com tempo pra semear, produzir, plantar e colher. Tem a ver com sustentabilidade, o que é sabotado por essas prestações infindas que começam a acossar o produtor antes que ele respire. Com a minha sensibilidade apenas, pela lógica vital, sem a formação sofisticada ou deficiente de muitos economistas e de impostores de plantão (que os há em todas as profissões) intuí que o curto prazo dos empréstimos oferecidos seria algo letal, que a sustentabilidade de uma empresa só poderia ocorrer com as operações de longo prazo. Estou de olho, paradoxalmente uma esperança, nesse congresso dos cartões de crédito, C4, em que duas vozes inesperadas dos que deveriam ser advogados do diabo e se tornaram advogados dos anjos, os Srs. Álvaro Musa e Francisco Valim, tocaram no necessário longo prazo para a sustentabilidade econômica, para a vida das empresas, sobretudo dos editores independentes, acrescento eu.

Cartas pedindo livros continuam chegando todos os dias para a formação de bibliotecas. Inclusive de dedicadas mães que resolveram formar bibliotecas para os filhos, fazem edificantes solicitações às editoras, para aumentar o acervo dos filhos. Repito meu jargão: Comprar livros, o consumo necessário. Fazem parte da cesta básica, não do choro. Comprar livros.

Tenho uma máquina móvel dos cartões Visa para vender livros. Portanto, mães, livros são vendidos com cartões de crédito em todos os pontos em que chegamos, em que pretendemos ir com "A Musa Ambulante: Livros ao encontro do leitor".

As Editoras vivem de vender livros. As livrarias vivem de vender livros, os autores, os ilustradores, toda uma cadeia produtiva e distributiva de trabalhadores. Por que temos de doar livros, a única coisa que temos para vender e dela sobreviver, depois de todas as arrecadações e custos? Estamos amarrados a um emaranhado de rapinas e ainda assim estamos de pé nessa atividade: "Fazer livros não têm fim" (frase ouvida de um histórico produtor editorial, Rubens de Barros Lima, que ele atribuía a Nelson Werneck Sodré). Mesmo na era tecnológica. Ainda tudo vira livro, todos os sonhos viram livros, todos os ofícios viram livros. Os chefs criam seus pratos, passam pela Tv e pela web, mas acabam virando livros que os jornais noticiam.

Hoje, na comercialização do livro, existe um fenômeno perverso: a consignação generalizada. Essa perversidade não é adotada pelas Livrarias Cultura, Saraiva em grande parte, Leonardo da Vinci, talvez Fnac (que não prestigia editoras independentes), me lembrem outras casas, se esqueci. No geral nos pedem, por exemplo, R$1.000,00 em consignação e daí a 30 dias nos prestam conta de R$70,00. Mandamos um volume grande de livros para as mais belas lojas, e recebemos um acerto mensal pífio. Somos financiadores de boas livrarias que se expandem, e as editoras esperam e vivem mais da honra de estarem em exposição nos espaços nobres. Isto fazemos em termos corteses, mas editoras sofrem. Não é negócio mútuo, mas adesão a um esquema. Assim tudo na perversidade da Economia, em que todos os contratos são de adesão.

Ficamos arrumando saídas. A Primavera dos livros foi a grande saída das editoras independentes. Vivemos um pré-história de ouro, totalmente de inclusão. Fundou-se a Libre, outras pessoas chegaram, mas a nossa agregação corre o perigo de tornar-se desagregação, se não cuidarmos da solidariedade entre os pares. Nós nos juntamos para agirmos sob uma nova mentalidade, não para raciocinarmos em termos de exclusão de pares aderindo a uma estéril burocracia. Todos devem ser chamados a participar da Primavera. Se alguns têm problemas, devem ser resolvido de forma sábia que leve à inclusão não à exclusão da participação. Criar meios de solução. Lamento muitas ausências, quem se importa? Eu me importo. A Livraria Duas Cidades ainda tem seu acervo, é sócia fundadora, quem foi buscá-la de volta? Alguns editores morreram no caminho (Marlene Barbosa, da Beca; Nelson dos Reis, da Nova Alexandria; Evanildo Bechara (o filho), da Lucerna; Alcides (da Íbis), estes, em 2007; José Luis, da Angra, há mais tempo). É preciso homenageá-los. Há ainda aqueles bravos companheiros que deixaram a entidade, por uma razão ou outra. Isto não pode ser considerado natural. A Libre não pode se tornar uma simples financeirização do raciocínio. A Primavera dos Livros precisa recuperar a agregação originária, do contrário trai-se a si mesma. A Hedra saiu, mas foi na Editora Hedra que se deu a grande agregação, onde nos juntávamos todos. Sempre fomos uma grande assembléia geral. Onde está o Paulo Antero Barbosa, marido da Marlene; onde estão Claudia (seu papel agregador foi fundamental). Cadê Aluízio, Ivana, Martha, hoje a discreta Camila, a delicada Isabela, onde ficou perdida a nossa face que conclamava a todos com atos agregadores. Hoje é outro tempo, gente que trabalha e aperfeiçoou muita coisa, mas não podemos perder a humanidade nem a solidariedade. Quando em compra do Ministério da Cultura para o programa Uma Biblioteca em cada Município detectou-se concentração de títulos, autores, editoras e repetição de acervos, fizemos, ou melhor, Paulo Antero fez um levantamento e nós reivindicamos para o proveito de todos a modificação em virtude da ausência de isonomia. No edital do Mec, este ano, sobre obras para necessidades especiais, nenhuma informação passou pela rede. Aonde chegamos? Temos de compartilhar as informações, não os segredos de nossa programação de títulos, as informações que alimentem o princípio da isonomia. A CBL já tem um código de ética, eu me preocupo que a Libre, como membro da pré-história, não tenha um código de ética ainda. Um editor, meu par, como se fosse se fosse algo natural para sua sócia não se preocupar com escrúpulos ou ética elementar, se apossou de um título traduzido do catálogo da Musa numa negociação impertinente com macunaíma.

A Bienal se inicia. Queria estar lá, como estive muitas vezes, algumas vezes em conjunto. Mas o preço dos estandes crescem para os pequenos editores que lidam com o curto prazo nas despesas e o longo prazo para a concretização de seus negócios. A complexidade é muito maior, por isso precisamos ser mais solidários. Há muita gente trabalhando, mas não basta.

O "jornal do jornal" fica para depois

Citei os livros dos chefs de cozinha, com matéria no Suplemento Feminino do Estadão. Tenho de citar o Aliás, que tem coisas boas para ler, sobretudo a coluna do José de Souza Martins.

E o UOl (o "jornal do jornal "se estende à web) me encanta e comove com a chamada sobre o filme "Lemon Tree", história da mulher palestina, Salma Zidane, que luta para que seus limoeiros permaneçam de pé. A minha história, hoje. A história dos pequenos editores independentes, hoje. Precisamos ser mais solidários, insisto. Estarmos além da simples financeirização do mundo. Participar das Primaveras é uma forma de recuperação, para que quem sabe com essas migalhas muitas editoras permaneçam vivas. A sustentabilidade para todos. Responsabilidade nossa, os que fazemos a Primavera dos Livros.

Friday, August 08, 2008

Ser editor, hoje "Revogar o Estado do medo"

Alberto Dines fez o seu "Jornal dos Jornais", hoje ele tem o programa "Observatório da Imprensa", que vai ao ar pela TV Cultura.


Eu quero fazer, no singular, o meu "jornal do jornal", assim minúsculo, sou letra minúscula, pois ler jornal, no papel, é minha "oração da manhã" de todos os dias. A comensalidade com o mundo. Comungar a palavra dos outros. Deus fala na História?, pergunta geral e certeza para poucos. E o jornal pode ser o veículo que registra a maior parte. O jornal registra a palavra de Deus na História. Não precisa ser confessional. Tudo o que é "confessional" tende a degenerar-se em poeira sectária.


jornal do jornal

"Cartões e Crédito ao Consumidor" Informe publicitário / 5/8/2008
Acho no meio do Estadão este encarte sobre o futuro dos cartões de crédito, que já começou, anunciando-se um congresso do setor chamado C4. Primeiro, não li. Mas um jovem executivo da família, que trabalha na Lyra, me telefonou para que eu guardasse para ele o Caderno. Aí fui ler. E me surpreendi que estão acordando, diante da perversidade destruidora dos modos econômicos atuais, totalmente contraproducentes sobretudo para o consumidor e , por efeito cascata, para a Economia. Como está não dá para ficar. Destaco a entrevista com Álvaro Musa: "É preciso alongar os prazos de retorno se quisermos ser sustentáveis" e, da entrevista, o período final: "Sustentabilidade é, por definição, negócio a longo prazo. Então não se pode pensar em retorno em curto prazo, caso se pretenda ser sustentável"
Já botei o dedo nesta ferida e ela continua sangrando para os pequenos e médios empresários no Brasil. Sobretudo para os editores independentes. Da cultura dos saudosos "papagaios", que não provei, introduziram os CDCs e giros rápidos para pagamentos mensais, enquanto os editores que participamos das compras públicas de livros e "financiamos"com nossas consignações a maior parte das livrarias, somente temos retorno a longo prazo. Todas as obrigações e cobranças nos afogam no curto prazo. E a nossa longa espera tem custos e punições desnecessárias. O contexto não é analisado. Vivemos o desastre e deixamos de fazer o que a Educação e Cultura pedem em geral. Por milagre ou loucura, acabamos fazendo algumas coisas escolhidas pelos programas de Bibliotecas públicas, comunitárias e escolares. Mas temos de esperar, esperar, esperar. Enquanto vamos participando de uma gincana cruel, acorrentados às nossas cadeiras tentando pagar contas de curto prazo quando nossos retornos são de longo prazo. Desequilíbrio maior não há. Isto se chama condenação pelo próprio trabalho, trabalho com relevância social. Imagine, está vindo indiretamente das feras dos cartões de crédito essa constatação que interpreto como a busca do equilíbrio e da sustentação pela adoção do longo prazo como arma para a perenidade dos negócios.

No mesmo Informe Publicitário dos Cartões de Crédito, aparecem os palestrantes do C4 e, em destaque, sob retratos, a opinião de alguns notáveis. Entre eles, surpreendentemente, a fala do presidente do Serasa (esta ameaça sumária sobre os cidadãos) e diretor de operações da Experian para a América Latina. Foi a melhor coisa que li, em termos de mentalidade nova, embora abomine o serasismo vigente, oportunidade de abusos para os agentes do medo econômico de plantão em todos os níveis e instituições, em todas as profissões deterioriradas geradas por esse bicho-papão que não faz medo à inteligência mas aos cidadãos de bem acuados pelo curtíssimo prazo das operações bancárias e todas as suas conseqüências predatórias. Mas este senhor Francisco Valim, com o desafio de presidir uma instituição que causa medo ao povo, fala o inacreditável em termos de sabedoria econômica, fósforo aceso nessas trevas:

"Uma economia saudável depende de um sistema financeiro saudável e vice-versa. As instituições financeiras podem lucrar numa economia perversa (grifo meu), mas por um determinado prazo. Então, isso não é sustentável a longo prazo, e o que todos querem é a permanência. Por isso, o papel das instituições financeiras é obter bons resultados, financiando e gerando bons resultados para toda a economia que, forte e dinâmica, vai criar demanda ao sistema financeiro que representarão mais negócios e lucros."

Do jeito que está, não adianta prevenir, alertar sobre este jogo do crédito de curtíssimo prazo contra o jogo dos que nos fazem esperar no longuíssimo prazo, se continuar assim, pequenos e médios empresários brasileiros, sobretudo editores e livreiros independentes (embora tenhamos atividade de relevância educacional e cultural que traz perenidade de conquista e desenvolvimento pessoal e social), todos, a cada dia, encontraremos nossas esperanças mortas e a confiança sempre abalada. Em dias de guerra incruenta. Por isso, minhas noites são manhãs. Hiatos entre o horror de um dia e outro dia, a máquina desalmada da jornada de trabalho.

Encerro com Beth Néspoli, comentando o monólogo teatral de Bonassi, interpretado por César Figueiredo, peça que "aborda os conflitos do escritor que vive do seu ofício": "No palco, César Figueiredo interpreta um escritor literalmente amarrado pelo pé à sua cadeira de trabalho. Bem, ele próprio a ela se prendeu. Movido pelas contas a pagar? Ou por outras carências e desejos?"

Tanto as contas a pagar (aguilhão medonho) como outras carências e desejos impedidos de nascer pelos atos "assassinos" dos agentes econômicos que, em vez de soluções às empresas e consumidores, estão mais preocupados com os seus prontuários do que em atender bem, oferecer soluções que gerarão lucros, em vez de matar o cliente por erros crassos de burocracia. Ninguém é punido, somente o cliente. E buscar reparação e justiça custa caro. Requer tempo, como sair em busca do velocino de ouro, se estamos amarrados às nossas cadeiras.

Que as verdadeiras princesas detectem cada ervilha debaixo de seus colchões e as retirem para que tenhamos um sono melhor e nossos sonhos de humanidade prosperem. Nossa escolha é entre a vida e a perversidade econômica. Creio que este C4 sobre cartões, com algumas vozes (outros comentários sob os retratos são bem prosaicos e dentro do status quo), contribuirá para localizar alguma ervilha incômoda e retirá-la, para acordarmos melhor para o dia de trabalho, no longo prazo, vida sustentável. Contra a cultura da morte, generalizada. O medo generalizado.

Fecho com o ouro da frase do presidente da OAB Cezar Brito,:
bem sob o retrato, no alto da primeira página do Estadão, 5 de agosto de 2008:

"O que propomos é revogar no Brasil o Estado do medo. Ficamos raciocinando sempre pela lógica do medo." Destaque triplo: aspas, negrito e itálico. Ainda vou comentar essa frase, por que a destaquei com ouro?

Thursday, August 07, 2008

Ser editor, hoje é ver como "A Princesa e a Ervilha"

Ser editor, hoje, é ter a sensibilidade de discernir o "minúsculo objeto invasor" sob todos os colchões. Sensilidade total, muito além das análises periféricas e a produção de raciocínios simplistas com a esperteza do senso comum. Temos de abarcar a inteligência com o nosso próprio corpo que percebe sob colchões e lençóis, edredons e cobertores quentes, que a ervilha está lá. É ela que precisamos remover para que o sono nos restaure e nossos sonhos não sejam vilipendiados. É uma metáfora e tanto este conto da tradição universal, "A princesa e a ervilha". Quero até reescrevê-lo, em forma de poema narrativo. Aceito contribuições. Se os nossos olhos estão cegos, o nosso corpo vê.

Continua